Há poucos dias estive a trabalho em Chapadão do Céu, em Goiás, e me emocionei com o que lá vi. Quilômetros de estradas ladeadas por áreas de soja sem fim, que emendam com as de Chapadão do Sul/MS, e descem para Aparecida do Taboado, correm para oeste e se juntam com as lavouras espetaculares de Bandeirantes e Bodoquena. Ainda no Céu estão canaviais verdejantes que se somam aos de Quirinópolis, e mais os de Costa Rica, Rio Brilhante e Dourados no Mato Grosso do Sul.
Tenho passado por essas estradas há décadas. Há 45 anos vou pescar no Rio Taquari, na boca pantaneira do Coxim, e assisti o Brasil sendo construído com duro trabalho incessante. Vi os primeiros gaúchos chegarem a São Gabriel do Oeste em cima de velhos caminhões de mudança deixando para trás tudo o que tinham, inclusive sua história familiar. Abastecia então o carro em postos precários, onde frentistas eram meninos e meninas de olhos azuis, pés descalços e mal vestidos, mas trazendo no rosto a coragem e a determinação de seus pais em plantar o futuro. Eram campos de terra fraca, desprezados pelos tradicionais agricultores do Sudeste. Passo lá agora e vejo centenas de milhares de hectares com a soja bufando, já no “canivete”, assim como a que cultivam os bravos sulistas de Rondonópolis, os de Sinop, Sorriso, Lucas do Rio Verde, Sapezal, Tangará da Serra e Juína no Mato Grosso.
Por essas estradas surgiram usinas de açúcar e álcool gerando eletricidade, e em menos de 10 anos criaram milhares de empregos, mudaram as cidades pequenas e médias em comunidades progressistas com IDH invejável, e tudo com a melhor tecnologia do mundo.
Nos últimos meses andei por Não-me-Toque/RS, e lá também as roças de grãos ocuparam todas as terras aptas, vi aves e suínos crescendo em Chapecó/SC, passei por Campo Mourão, por Medianeira e Cafelândia no lindo Paraná e dei graças a Deus pela brava gente que abriu Londrina, Maringá, Cascavel, Ponta Grossa, misturando europeus e asiáticos destemidos com caboclos paulistas e nordestinos num vigor híbrido de empoderamento.
Percorri o mágico Triângulo Mineiro, o sul cafeeiro de Minas e bati em Montes Claros e Janaúba, onde bananais produzem as frutas que consomem os brasilienses. Vi produção de ovos e morango surgindo do nada em Jetibá no Espírito Santo, onde o conilon sacudiu São Gabriel da Palha. Fui a Luis Eduardo Magalhães-BA, que conheci como Mimoso do Oeste há poucas décadas. E lá estão algodoais tão espetaculares quanto os de Campo Verde e Primavera do Leste/MT. Estive em Balsas no sul do Maranhão, Uruçuí no Piauí e lá tem soja e milho abundantes. E rodei pelas pastagens de Chupinguaia e Ji-Paraná em Rondônia, pela pecuária de corte sustentável de Esperança, no Acre, e de todo Mato Grosso do Sul; bebi o leite que escorre de Goiás e de Minas Gerais para os consumidores de São Paulo e do Rio de Janeiro, vi as frutas exportadas do Ceará e do Rio Grande do Norte, visitei os canaviais produtivos de Alagoas, os cacaueiros do sul da Bahia, o óleo de palma do Pará, o gadão do Rio Grande e testemunhei as duras lutas dos produtores da Amazônia e do Nordeste.
Esta gente extraordinária, mulheres e homens que batalham todos os dias, anos a fio, arrostando dificuldades de toda ordem, estão construindo de fato o nosso Brasil. Quem conhece Ribeirão Preto, Araçatuba, Bauru, São José do Rio Preto, Presidente Prudente, Marilia, Assis, sabe disso. Ou Campinas e Jaú, além de Barretos, Bebedouro, São José dos Campos, entre tantas outras grandes cidades paulistas que nasceram e cresceram empurradas pelos bandeirantes modernos que cultivaram suas terras. Passo Fundo e Santa Maria, Caxias e Gramado, Ijuí e Alegrete, no grande Rio Grande do Sul, idem. E também Lages com suas florestas plantadas, ou Joaçaba, Campos Novos e Concórdia em Santa Catarina, e ainda o Paraná inteirinho… Mas quem nunca foi a Rio Verde, Piracanjuba ou Formosa, em Goiás, não sabe do que estamos falando. Ou a Gurupi e Araguaína, no Tocantins, a Santarém e Marabá, no Pará, a Vitória da Conquista, Juazeiro ou Feira de Santana, na Bahia, a todo este imenso sertão brasileiro, não saberá jamais quem faz esse País bombar.
Toda essa brava gente brasileira quer progredir e avançar socialmente, não importando se são pequenos, médios ou grandes. Todos mourejam o dia todo torcendo ora por sol, ora por chuva, e sonham todas as noites com um futuro melhor para seus filhos e netos. E transformam seus sonhos na bela realidade do agronegócio brasileiro pujante e competitivo, sustentável e moderno.
Toda essa gente está preocupada com a brutal crise econômica, social e política em que maus gestores meteram o Brasil. Mas, apesar dessa crise sem precedentes, toda essa gente destemida continuará a plantar, tratar e colher sua soja, seu milho, seu algodão, seu arroz e feijão, seu café, sua cana-de-açúcar, suas frutas e verduras, seu cacau, suas pastagens, sua seringueira, seu tabaco, seu amendoim e seu girassol. Vai transformar grãos em carne de frango, de suínos e em leite e derivados, e pastos em carne bovina. Vai plantar eucaliptos e pinheiros, vai dar mercado para quem produz insumos e serviços, vai fornecer a matéria-prima para a indústria de alimentos e bebidas, de moda, de móveis e de livros. Vai gerar empregos, riqueza e renda. Vai abastecer todos os brasileiros e vai alimentar milhões de estrangeiros. Vai continuar com sua inquebrantável bravura a construir uma grande Nação.
Que Deus os abençoe!
Roberto Rodrigues coordena o Centro de Agronegócios da Fundação Getulio Vargas, foi ministro da Agricultura e escreve artigos todas as terceiras segundas-feiras do mês.