Na semana de 15 a 25 de abril, estive com o Senador Blairo Magggi visitando a China e a Índia onde tivemos uma agenda intensa. Na China tivemos a oportunidade de nos reunirmos com representantes do setor privado e governamental chinês para discutirmos quais as tendências de futuro do mercado chinês. O que nossos principais compradores de soja estariam interessados em comprar e qual seria o potencial de crescimento da demanda daquele país.
Em todas as reuniões ficou claro a importância do Brasil como fornecedor de soja e a crescente demanda do país. No último ano a China importou 27 milhões de toneladas de soja do Brasil e neste ano deve passar de 30 milhões de toneladas. Mas também ficou claro em todas as reuniões que a China tem noção de que a ineficiência de logística do Brasil é uma das principais preocupações no curto prazo para manter o país como seu principal fornecedor.
O nosso objetivo nesta viagem a China era relatar a importância da biotecnologia no Brasil, nosso discurso foi sempre baseado na agricultura tropical brasileira onde temos muitas pragas e doenças, ficando sempre demonstrado a importância da agilidade na liberação de novos eventos biotecnológicos produzidos no Brasil, ressaltando que o uso da biotecnologia para os produtores é uma ferramenta importante, pois encurta tempo e reduz o uso de defensivos agrícolas o que é muito positivo ao meio ambiente.
Abordamos com todos os agentes que estivemos reunidos na China sobre a nossa preocupação sobre o atual demora de aprovação de novos eventos biotecnológicos, sempre respondendo aos questionamentos e colocando da seriedade da aprovação de novos eventos no Brasil, ressaltando o trabalho da CTNBio e a segurança adotada na aprovação de novos eventos.
Outro ponto para nós muito importante era saber do sentimento por parte dos interlocutores chineses sobre a logística, em que poderíamos ajudar e onde poderíamos criar parcerias para que reduzíssemos os atuais impactos de nossa precariedade de infraestrutura, buscando saber da intenção futura de mercado.
Em reunião com a COFCO, uma empresa Estatal muito importante na China e que compra muita soja do Brasil, seu executivo, Cheng Muping, nos informou que nesta safra tiveram um impacto muito grande nos carregamentos brasileiros e isto os deixa muito preocupados. Pediu-nos claramente para que fossem feitos investimentos urgentes nos portos brasileiros e completou dizendo que a partir de março a fila nos portos brasileiros cresceu muito, com relatos de espera de mais de 60 dias o que causou a paralisação da fabrica de esmagamento da COFCO na China.
Cheng Muping nos disse que a demanda chinesa seguirá crescendo e que a demanda por ração esta fortemente aquecida e a China deve importar mais de 64 milhões de toneladas de soja no próximo ano. Segundo ele, a demanda por milho também crescente fortemente, e a China pode já no curto prazo importar 15 milhões de toneladas de milho. Colaborando com essa informação, as projeções do USDA apontam que em 10 anos a China superará o Japão e o México e se tornará a maior importadora mundial de milho, demandando 20 milhões de toneladas do cereal.
Em reunião com a Associação da Indústria Animal, o presidente, Senhor He Xintian, nos informou que eles têm grande interesse na compra de farelo de soja do Brasil, o que não ocorre porque o farelo tem taxas de importação, mas espera que no futuro essas taxas possam cair através de acordos bilaterais. E acrescentou que na China existe um Fundo de Investimento para financiamento de projetos agroindustriais fora da China.
Na Hopefull empresa privada com faturamento superior a 30 bilhões de dólares seu presidente Shi Kerong deixou claro o interesse sobre soja convencional, só falou disto apesar das nossas colocações sobre soja transgênica, questionou o tempo todo sobre nossa capacidade em produzir a soja convencional, como se dava a forma da produção de semente, se tínhamos capacidade de estocarem para a soja convencional etc. Questionou se o Brasil teria como já na próxima safra fornecer 10 milhões de ton. de soja convencional a empresa dele. Ponderamos das dificuldades de segregação, mas ele estava muito entusiasmado com a soja convencional e disse que o mercado na China é crescente e terá muito interesse na convencional mesmo pagando mais caro por ela.
No setor governamental, estivemos reunidos com o Vice-Ministro da Agricultura, Niu Dun, que nos disse que existe uma forte preocupação da China com relação à segurança alimentar e que o país tem grande respeito pelo Brasil como parceiro. O Vice-ministro nos disse que uma parcela importante da sociedade liderada por ONGs tem sido contra a importação de produtos transgênicos e que tem feito muita propaganda para influenciar a opinião publica.
O Vice-Ministro compartilhou um dado que nos chamou muita atenção. O Governo chinês estaria disponibilizando 100 bilhões de dólares para investimentos em agricultura fora da China. Podemos vislumbrar que países com grande potencial de expansão agrícola e que tem grande carência de recursos, como Moçambique, por exemplo, seriam beneficiados com esses investimentos, como uma política de longo prazo de garantia de suprimentos de comida para os chineses.
Entretanto, o que nestas reuniões me deixou mais surpreso foi à mudança nos discursos dos chineses. Todos colocam a preocupação da China com relação à segurança alimentar e à sustentabilidade ambiental, e por isso nos foi questionado muito sobre o potencial brasileiro de crescimento da produção, mas que de forma alguma eles esperam que o Brasil desmate novas áreas. E é claro que relatamos que essa não é uma intenção brasileira, e que temos muitas áreas abertas de pastagens onde à agricultura pode se expandir sem desmatar.
Outro ponto que chamou nossa atenção é quanto aos transgênicos. Ficou nítido o interesse das empresas por soja convencional. E quando questionamos qual a tendência do mercado na relação entre transgênicos e não transgênicos, tanto o setor privado quanto governamental nos informou que a grande massa é menos sensível a isto, compra o mais barato. Mas que uma parcela importante da população chinesa, melhor colocada financeiramente, estaria atenta e teria preferencia por produtos não transgênicos.
E todas as empresas importadoras de produtos do Brasil que conversamos se mostraram interessadas em criar um mercado especifico de soja convencional, mesmo que tenham que pagar mais. Inclusive fomos questionados se existia a possibilidade do fornecimento no curto prazo de volumes superiores a 10 milhões de toneladas de soja convencional. Isso é algo que realmente chama a atenção e pode influenciar todo o mercado brasileiro, afinal nós produtores vamos plantar o que o consumidor demandar.
Portanto, ficou patente que houve uma mudança nas tendências chinesas quanto à qualidade dos produtos importados e que existe um aumento na preocupação de se fornecer produtos seguros do ponto de vista alimentar. Também, que se abriu a possiblidade do Brasil exportar tanto soja transgênica quanto não transgênica, o que é muito positivo para nós produtores, já que temos a possibilidade de manejar as duas. E junto com todas essas possiblidades, também ficou claro que temos um dever de casa urgente com relação à nossa infraestrutura.
Confesso que foi muito interessante vermos a preocupação do Governo chinês com os anseios da população e suas necessidades. E ao contrario do que se poderia imaginar, o governo comunista se mostra muito sensível ao que o povo pensa e deseja todos os 1,4 bilhões de pessoas. E é claro que para nós brasileiros é muito positivo o Governo chinês ter elegido como meta a melhoria da qualidade de vida da população. Isso se traduzirá em um melhor poder aquisitivo das pessoas que poderão comer melhor, e em última análise, demandarão mais alimentos importados do Brasil.
O nosso maior desafio agora é saber aproveitar a demanda crescente da China por produtos alimentícios e conseguir captar, com isso, recursos para investimentos em infraestrutura no Brasil. As diferenças culturais são muitas e existe uma grande desconfiança de ambos os lados. Mas amadurecida a relação, com projetos bem elaborados e com uma sinalização positiva do governo assegurando esses investimentos, sem duvida o Brasil partilhará ganhos muito positivos nessa locomotiva chamada China.
Da China seguimos para a Índia, onde fiquei surpreso com o contraste entre os dois países mais populosos do mundo, China extremamente organizada e a Índia o caos, fiquei impressionado como os indianos conseguem conviver entre si com tantas religiões, dialetos e diferenças de classe. A Índia é uma experiência que não consegue ser contada apenas vivida e recomendo a todo político brasileiro conhecer.
Na índia na embaixada brasileira tivemos uma reunião com a Pricewaterhouse discutindo sobre o mercado de carnes na Índia, parece estranho à discussão do tema porque se pensa que a índia é vegetariana, ela já foi mais, uma mudança do habito alimentar indiano tem ocorrido em uma população de 1,2 bilhões de indianos que estão melhorando financeiramente e com isso passam a comer mais, e buscam por proteínas.
O indiano Mudit Agrarwal da Pricewaterhouse (PwC) nos fez um relato detalhado sobre a evolução do mercado de carnes na Índia o que nos interessou muito principalmente pela perspectiva da Índia se tornar um grande importador de alimentos, e isto se mostrou factível, afinal processo semelhante observamos na China que em dez anos se tornou um grande importador de alimentos, e a Índia inicia o mesmo processo.
Na Índia as redes de supermercado começam a ser implantadas, e isto é muito positivo uma vez que a falta de infraestrutura de comercialização de carne prejudica seu consumo, a maioria da carne ainda é comercializada em pequenos açougues. É importante salientar que 32% da população indiana é vegetariana e apenas 30% da população que não é vegetariana consome carne regularmente, sem falar que nenhum indiano da religião Hindu que é 80% da população consome carne na terça feira.
O consumo de proteína tem crescido significativamente, impulsionado pelo crescimento econômico da população, os hábitos alimentares dos indianos com a globalização estão mudando, jovens começam a ir aos fast food, a internet tem levado os jovens a experimentar o diferente e com isso vegetarianos deixam de ser vegetarianos e consomem carne de frango, é importante salientar que por questões religiosas o consumo de carne bovina e de suínos na índia é quase nulo.
A indústria aviária tem crescido muito na Índia, eles possuem um lobby muito forte, o que faz com que o mercado de aves seja fechado, com taxas muito altas para importação, mas é claro que isto deve mudar assim que eles não forem autossuficientes, esta proteção faz com a indústria nacional de aves tenha uma margem alta, para termos uma ideia à carne de frango fresca custa U$ 4,00 o Kg e a processada U$ 12,0.
Quando olhamos para o mercado atual não vemos nenhum mercado para soja na Índia, afinal eles produzem anualmente algo em torno de 11 milhões de ton. o que é suficiente e sobra ainda para exportar, 60 % do farelo de soja produzido na Índia é exportada, mas é importante olharmos os números, a área agrícola da Índia não tem como crescer, a população está mudando seu habito alimentar e com isto o consumo de soja tem crescido em 6% ao ano, como a produção não cresce breve teremos ai um potencial importador.
É importante olharmos a Índia no futuro breve, afinal é a população que mais cresce no mundo, já são 1,22 bilhões de habitantes, com uma renda per capita de U$ 1.200 ainda muito baixa, mas que dobrou nos últimos 5 anos, com um Produto Interno Bruto (PIB) que cresceu de 11% em 2012, com isso o setor aviário cresce 15% ao ano e de ovos cresce 7% a.a. somado a isto temos ainda o mercado de leite que cresce 8% ao ano, e olha que a Índia produz 13% do leite do mundo e o consome apenas 20% do rebanho leiteiro indiano recebe ração.
A média de consumo de carne por indiano é de 3,3 kg ao ano e de 57 ovos por ano, enquanto a recomendação do Instituto Nacional de Nutrição da Índia recomenda 11 kg de carne a.a. e de 180 ovos, mas vale ressaltar que em 2003 o consumo de carne era de 1,4 kg/habitante um crescimento de 135%%, institutos projetam que nos próximos 10 anos a media de consumo de carne por Indiano supere 11 kg.
Quando se entra Índia adentro conseguimos ver o potencial econômico e de crescimento deste país, cidades inteiras sendo construídas em um contraste entre o desenvolvimento de primeiro mundo e uma agricultura totalmente medieval, mas que como todo país em crescimento acelerado a urbanização é crescente e o governo busca equilibrar o anseio da população com suas ações politicas.
Como podemos ver existe um mercado em construção, e este mercado também está olhando para o Brasil, já existindo uma pressão interna para a abertura do mercado de alimentos, se as previsões se concretizarem em breve teremos mais um grande importador potencial para nossa soja e nosso milho, e quem sabe também para nossa carne afinal frango nada mais é que soja e milho transformados, a nós brasileiros fica o dever de casa a ser feito para aproveitar e atender mais este mercado.
Por Glauber Silveira