Devido à ideologia, o Brasil ficou atrasado por anos com relação à biotecnologia. Segundo a Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU, biotecnologia significa “qualquer aplicação tecnológica que use sistemas biológicos, organismos vivos ou derivados destes, para fazer ou modificar produtos ou processos para usos específicos.”. Os produtores e a nação perderam muito pelo preconceito envolvido na evolução da ciência. Felizmente, em tempo isto mudou e a biotecnologia teve grandes avanços no país. Saímos de uma posição de total atraso científico para uma posição totalmente privilegiada e admirada até mesmo pelo EUA e a Europa.
O que se fez no Brasil foi montar uma comissão inteligente para analisar o risco do evento transgênico ao meio ambiente, saúde humana, às plantas e aos animais. Por isso, a CTNBio possui quatro grupos de técnicos especialistas em cada uma dessas áreas (ambiental, humana, vegetal e animal), cada grupo com 3 titulares e 3 suplentes e todos os 24 cientistas e PhD. Junto a este grupo, temos ainda os órgãos do estado que vão registrar os produtos oriundos dessa tecnologia. O risco proposto para o evento passa pelo pente fino desses cientistas, o que legitima a aprovação ou não do evento. O modelo brasileiro é reconhecido como o mais inteligente, sendo copiado por outros.
Infelizmente, de tempos em tempos ressurgem indagações sobre o que se aprova na CTNBio. Claro que questionamentos são sempre importantes, mas precisam ser fundamentados na ciência e não na ideologia e preconceito. Ao contrário do que se alega, a transgenia vegetal usada no Brasil e no mundo busca a redução do uso de defensivos agrícolas, sejam inseticidas, fungicidas e herbicidas. Sendo assim, podemos dizer que a transgenia nada mais é que a melhor ferramenta de redução de uso de defensivos que temos no momento.
Hoje, por exemplo, existem vários eventos de resistência a herbicidas em estudo na CTNBio. E ao que ao contrário do que questiona o representante do Ministério público (MP), essa resistência é muito importante para agricultura brasileira. Afinal, se continuarmos com um único evento de resistência herbicida (glifosato), cria-se uma dependência do produto, que só nesta safra já subiu de preço 80%. Assim, novos eventos irão gerar competitividade entre produtos e a sua rotação, sendo isto muito importante ambientalmente.
É preciso entender que o Brasil tem um clima tropical e por isso muito propício a pragas, como as ervas daninhas, e doenças. Enquanto países de clima temperado como os EUA ficam sob gelo por 3 a 4 meses o que promove um controle natural, no Brasil não temos nada disso, o que gera a necessidade de controle com tecnologia. Mas se uma mesma tecnologia for usada continuamente, seja ela transgênica ou não, com o tempo perde sua eficiência, como os antibióticos na medicina. Neste caso, quanto mais eventos e de diversas empresas tivermos, maior segurança na produção e competitividade teremos.
Alguns eventos estão sendo questionados, sendo um deles o de resistência ao 2,4-D, simplesmente por uma visão equivocada do produto que está a mais de 60 anos no mercado. Este já produto foi reavaliado em quase todo o mundo e continuou sendo recomendado. O 2,4-D é um produto que evoluiu com a preocupação ambiental, alterando sua fórmula antes de base éster, extremamente volátil, para ser à base de sal. Além disso, trata-se de um produto genérico, assim como o glifosato, por haverá competitividade no mercado.
Hoje no campo se busca ganhos de produtividade e redução de custo. Trata-se da sustentabilidade da atividade, produzir mais na mesma área a custos menores. Por isso, não podemos ficar olhando para o passado sem olhar para frente, precisamos de tecnologia e produtividade. Hoje, para um pequeno ganho de produtividade se gasta muito, o que nos mostra que o grande desafio é reduzir custo nestes ganhos. Agilizar a liberação de eventos de diferentes empresas é fundamental para vencer esse desafio.
O MP vem questionar a CTNBio, argumentando que haverá excesso de uso de herbicidas e não sobre a transgenia. O raciocínio é paradoxal, eles alegam que a transgenia vai gerar mais uso de agrotóxicos, quando como já explicado é totalmente o inverso. Ou seja, é a falta de conhecimento ou ideologia, a impedir a liberação de novos eventos. Na verdade, o que fatalmente ocorrerá é que se criará um retrocesso à produção nacional, mantendo o uso e hegemonia de um único herbicida (glifosato), ficará mais caro produzir, aumentará o risco de perdas de produção agrícola, aumentará o uso de herbicidas e ainda e a inevitável inflação de alimentos.
Caso semelhante à intervenção na CTNBio pelo MP temos visto com relação a aprovação de defensivo agrícolas, em que sua interferência tem dificultado a liberação de novos produtos. O que é importante se dizer é que se não há rotação de ingredientes ativos dos agrotóxicos, ao invés de se diminuir a dose de produtos, se faz necessário uso mais intenso. E o pior, mesmo apresentando o argumento cientifico de órgãos de inquestionável competência, a soberba e a ideologia imperam e isto tem custado caro ao Brasil e precisa ser revisto.
A CTNBio tem por objetivo o questionamento, o debate, e o MP faz parte deste processo, a discussão faz com que tenhamos avanços, o contraditório. Temos que fazer audiências públicas sim, mas é preciso respeitar o argumento científico e a opinião da maioria. Afinal a CTNBio tem critérios muito rígidos adotados para a tomada de decisões e que tem sido seguidos. Infelizmente, muitos representantes do MP têm apenas discurso e ideologia e isto é ruim ao Brasil e precisa ser enfrentado.
O problema no Brasil é que se confunde o mau uso por algumas pessoas de uma determinada técnica ou produto, generalizando, e isto é prejudicial. O Brasil pela sua incapacidade de fiscalizar e punir generaliza punindo a todos pela indisponibilidade, como um pai que acorrenta o filho para que ele não saia e erre, ao invés de educar ou punir se ele realmente tiver errado. Claro que o mais fácil seria não termos biotecnologia no Brasil, não termos transgênicos ou defensivos aprovados, mas o mais fácil é o melhor?
* Glauber Silveira